Fala pessoal,
Infelizmente um dos assuntos desse início da semana foram às ameaças a Independência do Banco Central americano - e é meio triste escrever sobre isso em pleno século 21, discutindo algo que já deveria ser cláusula pétrea da economia moderna: a independência dos Bancos Centrais.
Poucas instituições hoje têm um papel tão crucial para a saúde de uma economia quanto os Bancos Centrais. São eles que buscam equilibrar a moeda, domar a inflação e manter a engrenagem da economia girando no ritmo certo. Mas, para isso, uma condição mínima precisa ser respeitada: independência. Ora, quando falamos de governos, os incentivos podem ser dispersos, com o curto prazo sendo priorizado em detrimento do longo prazo.
Todo governante quer colher o fruto da economia durante o seu mandato - e isso pode influenciar decisivamente na decisão de politicas monetárias e impactar muito negativamente o longo prazo.
As sociedades, e o futuro, não podem ficar a mercê de oportunismos políticos. Essa semana, Donald Trump ameaçou a independência do mais importante BC do mundo ao querer demitir Jerome Powell por não concordar da condução monetária que o Presidente do FED vem fazendo:
A defesa da autonomia dos Bancos Centrais — seja aqui no Brasil, nos EUA ou no Camboja — é uma defesa da racionalidade econômica, da ordem econômica mundial e de sociedades mais sólidas. Sem isso, abrimos espaço para decisões populistas que podem custar caro para toda a sociedade. A independência deve sempre vir com transparência e mandatos bem definidos (aqui no brasil temos o mandato da inflação, lá nos EUA o mandato é duplo, com inflação e pleno emprego).
A história esta ai para aprendermos - estudos apontam, com dados científicos, que bancos centrais independentes tendem a registrar menores números de inflação e levar a economia mais próximo ao ponto ótimo. O trabalho de Eijffinger e De Haan destaca que, ao isolar os BC das pressões políticas, o resultado é uma inflação controlada e de que a independência tira o peso da inconsistência temporal, onde os formuladores de políticas priorizam ganhos econômicos de curto prazo (como o aumento do emprego), em detrimento da estabilidade econômica no longo prazo.
Pra quem quiser se aprofundar, segue alguns papers bem interessantes:
The Political Economy of Central Bank Independence - Sylverster Eijffinger/Jakob De Hann
Populism and Central Bank Independence - Charles Goodhart/ Rosa Lastra
Measuring the Independence of Central Banks and Its Effect on Policy Outcomes - Cukierma/ Webb / Neyapti
Central Bank Independence and Macroeconomic Performance: Some Comparative Evidence - Alberto Alesima/Lawrence Summers
Political and Monetary Institutions and Public Financial Policies in the Industrial Countries - Grilli/ Masciandaro / Tabellini
O mandato de Powell vai até maio de 2026 e a demissão só é possível por justa causa - e não, não concordar com a direção dos juros não é justa causa. Qualquer tentativa de destituí-lo provavelmente acabaria na Suprema Corte.
Depois de toda a confusão, Trump soltou declarações públicas dizendo que não tem a intenção de demitir Powell, se contradizendo das últimas falas. O episódio só trouxe mais ruídos para o mercado, que viu em suas falas um claro atentado à institucionalidade… na segunda, enquanto o Brasil estava em feriado, as bolsas americanas caíram na média de -2,5% por essas cutucadas de Trump ao Banco Central.
Como eu sempre digo:
A solução de um problema político quase sempre causa um problema econômico. E a solução de um problema econômico quase sempre causa um problema político.
Aqui no Brasil, a independência do BC é coisa recente, desde 2021. Mas no mundo desenvolvido já estamos rodando nesse modelo há algumas décadas. No caso do Reino Unido, o primeiro ministro Tony Blair transformou o BoE independente em 1997. Antes disso, o ministro das Finanças podia coordenar as taxas com o estímulo fiscal, criando o que era conhecido como "economia stop-go", onde tínhamos períodos de expansão antes das eleições, seguidos por desacelerações dolorosas. O PIB demonstra que a independência contribuiu para uma jornada mais suave e consistente da economia. Observe como as oscilações ficaram bem menores:
Já na Turquia, as constantes interferências no BC mostrou seu preço na economia, com inflação subindo e o governo cortando juros:
Portanto, que a independência dos BCs nunca vire tema de comício, nem manchete de jornal. Que continuem sendo chatos, técnicos, previsíveis — e absolutamente essenciais. Afinal, no mundo da economia, previsibilidade é um baita elogio.
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